ÉLISÉE RECLUS - A EVOLUÇÃO, A REVOLUÇÃO E O IDEAL ANARQUISTA
“Ente nós, revolucionários, um fenômeno análogo deve realizar-se; nós também devemos conseguir compreender com perfeita retidão e sinceridade todas as idéias daqueles que combatemos; devemos fazê-las nossa, mas para dar-lhes seu verdadeiro sentido. Todos os raciocínios de nossos interlocutores, retardados pelas teorias ultrapassadas, classificam-se naturalmente em seu verdadeiro lugar, no passado, não no futuro. Eles pertencem à filosofia da história”. (RECLUS. 2002. p. 41). “A evolução é movimento infinito de tudo o que existe, a transformação incessante do Universo e de todas as suas partes desde as origens eternas e durante o infinito dos tempos. As vias lácteas que surgem nos espaços sem limites, que se condensam e se dissolvem durante os milhões e os bilhões de séculos, as estrelas, os astros que nascem, que se agregam e morrem, nosso turbilhão solar com seu astro central, seus planetas e suas luas, e, nos limites estreitos de nosso pequeno globo terráqueo, as montanhas que surgem e desaparecem de novo, os oceanos que se formam para em seguida secar, os rios que se vê formar nos vales, depois secar como o orvalho da manhã, as gerações das plantas, dos animais e dos homens que se sucedem, e nossos milhões de vidas imperceptíveis, do homem ao mosquito, tudo isto nada mais é senão um fenômeno da grande evolução, arrastando todas as coisas em seu turbilhão sem fim”. “Em comparação com este fato primordial da evolução e da vida universal, o que são todos estes pequenos acontecimentos denominados revoluções: astronômicas, geológicas ou revoluções políticas? Vibrações quase insensíveis, aparências, poder-se-ia dizer. É por miríades e miríades que as revoluções se sucedem na evolução universal; mas, por mínima que sejam, elas fazem parte deste movimento infinito”. .............................. “O mundo atual se divide em dois campos: – aqueles que agem de maneira a manter a desigualdade e a pobreza, isso é, a obediência e a miséria para os outros, as fruições e o poder para eles mesmos; – e aqueles que reivindicam para todos o bem-estar e a livre iniciativa. Na grande família da humanidade, a fome não é unicamente o resultado de um crime coletivo, é ainda um absurdo, pois os produtos ultrapassam duas vezes as necessidades de consumo. Tendo a evolução econômica contemporânea justificando-nos plenamente em nossa reivindicação de pão, resta saber se ela justifica-nos igualmente em outro domínio de nosso ideal, a reivindicação de liberdade. ‘Nem só de pão vive o homem’, diz um velho provérbio, que permanecerá sempre verdadeiro, a menos que o homem regresse à pura existência vegetativa. Mas qual é, então, está substância alimentar indispensável fora o alimento material? A Igreja de todos os cleros prega-nos que é a ‘Palavra de Deus’; O Estado determina-nos que é a ‘Obediência às Leis’. Esse alimento que desenvolve a mentalidade e a moralidade humanas é o ‘fruto da ciência do bem e do mal’, que a mitologia greco-judaico-cristã e de todas as religiões que deles derivam nos proíbe, como alimento venenoso por excelência, como peçonha moral viciando todas as coisas, e, até mesmo, ‘a terceira geração’, a descendência daquele que a provou! Aprender. Eis o crime segundo a Igreja, o crime segundo o Estado, o que quer que possam imaginar padres e agentes de governo que absorveram, apesar disso, esses germes de heresia. Aprender. Ai está, ao contrário, a virtude por excelência para o individuo livre, desligando-se de toda autoridade divina ou humana: ele rejeita igualmente aqueles que, em nome de uma ‘Razão suprema’, arrogam-s o direito de pensar e falar por outrem, e aquele que, em nome da vontade do Estado, impõem leis, uma pretensa moral exterior, codificada e definitiva. Pensar, falar, agir livremente’ em todas as coisas. O ideal da sociedade futura, em contraste com a sociedade atual, define-se da maneira mais clara! De uma só vez o evolucionista, tornando-se revolucionário, separa-se de toda a igreja dogmática, de todo corpo estatutário, de todo agrupamento político de clausulas obrigatórias, de toda associação, publica ou secreta, na qual o societário deve começar por aceitar sob pena de traição, ordens incontestes. Assim o homem que quer realmente desenvolver-se como ser moral deve defender exatamente o contrário do que recomendam a Igreja e o Estado: ele deve pensar, falar, agir livremente. Estas são as condições indispensáveis de todo o progresso. A plena e absoluta liberdade de exprimir seu pensamento em todas as coisas, ciência, política, moral, sem outra reserva alem daquela de seu respeito por outrem”. (RECLUS. 2002). .............................. ÉLISÉE RECLUS - Eminente geógrafo, intelectual e anarquista francês. Nasceu em 15 de março de 1830. Filho de um pastor protestante estudou na Universidade em Montauban e Berlin. Em 1864 conheceu M. A. Bakunin, de quem se tornaria amigo e companheiro até à morte, sendo o orador no seu sepultamento. Sendo já um reconhecido geógrafo, participou ativamente da Comuna de Paris de 1871. Aprisionado, foi condenado a degredo, mas um amplo movimento internacional, reunindo intelectuais de vários países, conseguiu que a pena fosse comutada em expulsão para a Suíça. Viajou por todo o mundo, durante o trabalho de pesquisa que fez para preparar a Nova Geografia Universal, aproveitando esse fato para estabelecer contatos com os núcleos anarquistas dos países por onde passava. Esteve em Portugal nos anos de 1886 e 1887 tendo incentivado os primeiros grupos anarquistas a se organizarem de forma autônoma e, em 1893, esteve no Brasil, Uruguai, Argentina e Chile. No ano seguinte participou da fundação da Universidade Livre de Bruxelas onde seria professor. Tal como seus outros irmãos, em particular o fourierista e libertário Élie Reclus, Élisée foi um dos expoentes intelectuais do anarquismo do século XIX. Suas obras O Homem e a Terra e A Montanha, tal como muitas de suas reflexões nos seus textos geográficos, que o tornaram um dos fundadores da moderna geografia humana, são exemplos de uma visão precursora da ecologia. De sua autoria foi publicado no Rio de Janeiro, em 1900, Estados Unidos do Brasil, o capítulo da Nova Geografia Universal referente ao país. Destaca-se ainda seu livro Evolução, Revolução e Ideal Anarquista. Morreu em Bruxelas a 4 de julho de 1905. RECLUS, Élisée. A evolução, a revolução e o ideal anarquista. Imaginário. São Paulo. 2002. 131p. PS.: 1) Aos discípulos de Platão e Iluministas de plantão que sonham diuturnamente com uma ‘elite intelectual’ no Poder (estilo ‘vanguarda’ marxista-leninista), por favor, aqui falamos de evolução como ‘movimento infinito de tudo o que existe’ e de miríades e miríades derevoluções que se sucedem na evolução universal. “Utilizar-se de fuzis, baionetas e canhões” conforme transcreveu, de Marx-Engels, Lênin em seu opúsculo O Estado e a Revolução à página 77 não é senão – justamente – opor-se a (r)evolução??? Vsevolod Mikailovitc Eichenbaum (Volin) – um dos fundadores do primeiro soviet livre em 1905 – argumenta corroborado, hoje, pela História do século XX, que a retirada de “todo poder aos soviet” foi um desserviço, um crime contra a evolução. (VOLIN. 1980. A revolução desconhecida [1]). 2) Um argumento de Camus que pode ajudar no entendimento da história da primeira metade do século XX: “O escravo, na verdade, não está ligado a sua condição, ele quer mudá-la. Ele pode, portanto educar-se, ao contrário do senhor; o que se denomina história não é mais que a seqüência de seus longos esforços para obter a liberdade real. (...) A história identifica-se, portanto, com a história do trabalhado e da revolta. Não é de admirar que o marxismo-leninismo-[ 3) Falemos de O homem revoltado camusiano... revolta, evolução-revolução não é uma outra história... em uma outra oportunidade... obrigado pela paciência e por ter conseguido chegar até aqui...ÉLISÉE RECLUS
A EVOLUÇÃO, A REVOLUÇÃO E O IDEAL ANARQUISTA
0 comentários:
Postar um comentário